Aquele era o velório de Everaldino, uma rapaz moço
vítima de uma congestão alimentar ocorrida depois de almoçar,
num restaurante a quilo, um prato de 1 Kg e 200 g de bucho.
Os amigos e parentes velaram-no em Feira de Santana.
Já passava das dez da noite quando chegou Arinelsom,
seu irmão e melhor amigo.
Ele correu até o caixão, beijou a testa do irmão,
abraçou sua mãe e seu pai, consolando-os Seu Nelson,
pai do finado, não continha as lágrimas nem as lamentações.
- Ah meu filho! Por que não fui eu no lugar de seu irmão.
- Não fala isso pai! O lá de cima pode escutar.
Neste instante chegou ao velório Tobias,
amigo das farras de Arinelsom e de Everaldino.
Trazia numa sacola seis garrafas de cana e uma peça de mortadela inteira.
- Escutem todos. Durante toda vida o falecido nunca
dispensou uma boa farra. Uma vez ele disse que gostaria que
no seu velório, fizessem uma boa farra.
Vamos ou não vamos fazer a vontade do "de cujus"?
Poucos instantes depois o silêncio da capela virou
vozerio e gargalhadas. Arrumaram uns copos e todo
mundo entrou na pinga. Fatiaram o morto, digo, a mortadela,
ligaram um radinho de pilha e o arrasta-pé estava formado.
Com o cansaço da vigília e completamente embriagados,
um a um dos farristas foram adormecendo.
O último a cair foi Nelson. Mais curtido pelos anos de cachaça,
bebeu até a última gota. Porém antes de apagar ouviu uma
estranha voz que parecia vir do outro mundo.
- Nelson, suas preces foram ouvidas.
E ele foi ao chão.
De manhã, na hora do enterro, Arinelson e Everaldino
abraçavam sua mãe, enquanto ela recebia as condolências de viúva.
Próximo ao túmulo dois amigos, Noé e Serafim,
companheiros das farras do que partiu, cochichavam.
- Noé, eu podia jurar que ontem a noite estava velando o
Everaldino e não o seu Nelson.
- Tu sabes que eu também! Mas quem está no caixão é seu Nelson.
O Everaldino tá bem vivo.
- É melhor a gente calar a boca, se não vão pensar
que nós bebemos demais ontem a noite.
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